Desafiando o Grok: Gerar um conto sobre espaços liminares

 


O Lugar Entre Lugares

No caminho de volta do trabalho, Elias caminhava pela mesma rua de sempre, o asfalto brilhando úmido sob a luz fraca dos postes. O dia havia sido longo, com reuniões intermináveis e o zumbido constante do ar-condicionado no escritório. Ele ajustou a mochila nos ombros, sentindo o peso das horas acumuladas. A cidade, normalmente vibrante, parecia estranhamente silenciosa. Nenhum carro buzinava, nenhum pedestre cruzava seu trajeto. Até o vento, que costumava soprar folhas secas pelas calçadas, estava ausente. Curioso, ele olhou ao redor, notando que as vitrines das lojas refletiam apenas o vazio.

Sem perceber, Elias deixou a avenida principal e entrou numa rua estreita, uma que não lembrava ter visto antes. As fachadas dos prédios ali eram diferentes, com janelas tortuosas e portas que pareciam não levar a lugar algum. Ele parou, franzindo a testa. Onde estava? Tentou consultar o celular, mas a tela permaneceu negra, como se a bateria tivesse se esgotado, embora ele soubesse que estava carregada. Intrigado, guardou o aparelho e continuou, os passos ecoando num ritmo que não combinava com o ambiente.

A rua se alargava, transformando-se numa praça circular. No centro, uma fonte seca, esculpida com figuras indistintas, parecia observá-lo. Elias sentiu um arrepio, não de frio, mas de algo mais profundo, como se o espaço ao seu redor estivesse vivo, respirando em silêncio. Ele tentou chamar por alguém, mas sua voz saiu abafada, engolida pelo ar denso. Olhou para trás, esperando encontrar o caminho de volta, mas a rua por onde viera havia desaparecido. Em seu lugar, havia apenas um muro alto, coberto de musgo luminescente esverdeado.

Sem alternativas, ele seguiu em frente, entrando num beco onde as sombras dançavam sem fonte de luz. As paredes ali pulsavam, como se feitas de carne viva, e o chão parecia macio, quase gelatinoso. Cada passo o fazia afundar levemente, deixando marcas que se desfaziam sozinhas. Elias tentou manter a calma, racionalizando que talvez estivesse sonhando. Mas o cheiro de ozônio no ar, misturado com algo metálico, era real demais para ser um sonho. Ele apertou o passo, o coração batendo rápido, enquanto o beco se curvava, levando-o a uma escadaria descendente.

Os degraus, feitos de pedra irregular, pareciam infinitos. Ele desceu, contando mentalmente, mas perdeu a conta após o centésimo. A escuridão ao redor era quebrada apenas por lampejos de luzes coloridas, como vagalumes, que flutuavam sem direção. Quando finalmente alcançou o fim da escada, encontrou-se numa vasta câmara subterrânea. O teto, tão alto que se perdia na penumbra, era sustentado por colunas torcidas, como árvores petrificadas. No centro da câmara, um espelho gigantesco refletia não Elias, mas uma versão distorcida dele, com olhos vazios e um sorriso que não era seu.

Ele se aproximou, hipnotizado. O reflexo não imitava seus movimentos; em vez disso, gesticulava, apontando para o lado. Elias seguiu o gesto, notando uma porta entreaberta, exalando uma luz dourada. Hesitante, ele atravessou o limiar, entrando num corredor cujas paredes eram cobertas de relógios. Cada um marcava um horário diferente, os ponteiros girando em direções opostas. O som dos tique-taques formava uma cacofonia que parecia sussurrar palavras incompreensíveis. Ele tentou decifrá-las, mas quanto mais se concentrava, mais sua mente se fragmentava, como se o lugar estivesse roubando seus pensamentos.

O corredor terminou numa floresta impossível, com árvores de galhos retorcidos e folhas que brilhavam como lâminas. O céu acima não era céu, mas um mosaico de cores girando em espirais. Elias sentiu a gravidade mudar; seus pés mal tocavam o solo, como se ele flutuasse. Entre as árvores, sombras humanoides moviam-se, mas ao se aproximar, elas se dissolviam em névoa. Uma delas, porém, permaneceu. Era uma figura encapuzada, segurando um livro que pulsava com luz própria. Sem falar, a figura estendeu o objeto, e Elias, movido por um impulso que não explicava, o pegou.

Ao abrir o livro, ele viu páginas preenchidas com símbolos que mudavam constantemente, como se escrevessem a si mesmos. Cada símbolo parecia carregar um peso, uma história, uma memória que não era dele. Ele tentou fechar o livro, mas suas mãos não obedeciam. As palavras começaram a fluir para fora das páginas, subindo pelo ar, envolvendo-o numa tempestade de letras. Ele gritou, mas o som foi engolido pela cacofonia dos símbolos, que agora formavam rostos, paisagens, momentos que ele nunca vivera.

De repente, tudo parou. Elias estava de volta à praça com a fonte seca. O livro havia desaparecido, assim como a figura encapuzada. Mas algo estava diferente. Ele sentia o mundo ao seu redor mais leve, como se parte dele tivesse ficado naquele lugar. Olhou para suas mãos; elas tremiam, e as linhas da palma pareciam traçar novos caminhos. Ele tentou voltar pelo mesmo beco, mas encontrou apenas a rua familiar da cidade. Carros passavam, pedestres conversavam, e o barulho do mundo real o envolveu novamente.

Elias chegou em casa, mas não conseguia se livrar da sensação de que algo o seguira. À noite, enquanto tentava dormir, ouviu um sussurro, não de uma voz, mas de um espaço vazio dentro dele. Nos dias seguintes, ele percebeu que conseguia ver coisas que outros não viam: vultos nos cantos, reflexos que não combinavam, portas onde não deveria haver portas. Ele começou a anotar tudo, temendo perder a sanidade. Suas anotações, porém, nunca repetiam uma palavra, como se o lugar que visitara tivesse imposto essa regra.

Semanas depois, Elias decidiu voltar àquela rua. Ele caminhou pela avenida, procurando o beco, a praça, qualquer sinal do que vivera. Mas nada encontrou. A cidade era apenas a cidade, sólida, previsível, barulhenta. Ainda assim, ele carregava aquele vazio, aquele sussurro que o fazia questionar o que era real. Será que o limiar ainda existia, escondido em algum canto da realidade? Ou será que ele, Elias, havia se tornado o limiar, um espaço onde o comum e o impossível se encontravam?

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